quarta-feira, 16 de março de 2011

Os Estranhos de Dunwich - O clã dos Whateley

De toda a galeria de personagens estranhos criados por H.P. Lovecraft, o clã dos Whateley e em especial Wilbur, talvez seja o mais bizarro.

Um dos personagens centrais na trama do clássico "O Horror de Dunwich" (para alguns o melhor conto de Lovecraft), Whateley é um híbrido, nascido da união blasfema entre uma humana e um Deus Exterior, um rapaz de aparência bizarra, com a mente distorcida pela loucura do Mythos e a ambição de cumprir seu destino como feiticeiro.

Wilbur não é apenas outro vilão lovecraftiano, ele é o vínculo definitivo entre as forças do Mythos e a humanidade, possuíndo características de ambos.

Segundo o conto, os Whateley, são uma família bastante antiga que imigrou para a América entre os primeiros colonos que fizeram a viagem para o Novo Mundo.

Eles ajudaram a fundar o povoado de Dunwich no interior de Massachusetts. Mas antes a família vivia no vilarejo de Salem que seria varrido pela paranóia da caça às bruxas em 1692. O patriarca da família, um vidraceiro e alquimista chamado Absalom Whateley era o líder de um culto pagão secreto chamado de "Os Crentes" (The Belivers). A congregação se reunia na floresta para reverenciar a natureza e realizar rituais muito antigos. Temendo que o povo da vila ou um magistrado descobrisse suas atividades, os Crentes decidiram buscar outro local para montar seu culto. Eles encontraram um vale isolado, além do Rio Miskatonic, a trinta milhas do povoado mais próximo.

Lá, longe de seus vizinhos puritanos, os Crentes estavam livres para professar a sua religião. Construíram um pequeno povoado na floresta de Dunwich nome que também foi adotado pela comunidade. Eles ergueram monolitos e círculos de pedra no topo das montanhas e se reuniam em datas significativas para seus ritos pagãos. Por alguns anos, tudo correu bem, mas então uma dissidência fraturou o culto. Jacob Whateley, o filho mais novo de Absolom, descobriu certas coisas contidas no livro que seu pai carregava, o Necronomicon. Ganhando acesso ao livro, cuja leitura era proibida para todos os outros, ele começou a estudar seu conteúdo.

Após algumas experiências nas colinas, Jacob rompeu de vez com os demais e deixou o vilarejo, construíndo uma casa próxima a Sentinel Hill. Jacob criou seu próprio culto com base nos ensinamentos contidos no livro e começou a atrair seguidores, entre os quais membros da família Bishop.

Enquanto isso, o filho mais velho de Absalom, Jeremiah começou a construir moinhos no entrocamento do Miskatonic, lançando bases para a futura prosperidade econômica de Dunwich. Com o passar dos anos, o antagonismo entre os dois lados da família Whateley cresceu culminando com uma tragédia em 1806 quando vários moinhos foram incendiados e inocentes mortos.

A medida que a sorte do vilarejo declinava, os Whateley degenerados continuavam seus experimentos blasfemos invocando entidades discutidas no tomo. Jacob havia passado de pai para filho o conhecimento adquirido com o livro e a cada geração a família tentava selar um pacto com as forças do Mythos. O Deus Exterior Yog-Sothoth era a força que eles invocavam em seus rituais no alto do Sentinel Hill.

No início do século XIX, Oliver Whateley líder do culto foi enforcado pelos cidadãos de Dunwich que o acusavam de bruxaria, feitiçaria e adoração ao demônio. O povo de Dunwich acreditava ter acabado com o culto, mas o filho de Oliver, Noah provaria ser ainda mais terrível que o pai. Noah vivia na mesma casa isolada aos pés de Sentinel Hill e dizem tornou-se líder do bando com apenas 14 anos. O homem que havia assumido o lugar de seu pai, desapareceu em uma noite escura sem deixar vestígios.

Noah se casou uma única vez em uma cerimônia oficializada por ele próprio diante de sua congregação. Por volta de 1878 sua esposa deu a luz a uma menina, Lavínia. Nessa época, Noah já havia estabelecido uma horrível fama ao amaldiçoar um juiz que não lhe favoreceu numa disputa. Não apenas o juiz morreu de uma doença misteriosa, mas sua esposa teve um aborto e seu filho primogênito sofreu um acidente fatal ao cair em um poço.

Em 1890, a mulher de Noah teve uma morte inexplicável depois de fugir para Dunwich pedindo socorro afirmando que seu marido ia matá-la. A mulher foi encontrada morta com a língua arrancada dentro de um quarto trancado. Noah jamais foi investigado, todos os membros de sua congregação afirmaram que ele estava presidindo uma cerimônia na ocasião diante de testemunhas.

Em 1913, Noah já chamado de "Velho Whateley" estava no fim da vida, quando enfim Yog-Sothoth atendeu as suas súplicas. Noah vinha conduzindo rituais em Sentinel Hill há anos, ele invocava Yog-Sothoth com o propósito de fertilizar o ventre de sua única filha. A demência de Whateley era tamanha que em sua ânsia por poder, aprovava a violação de Lavínia por uma abominação cósmica muitas e muitas vezes.

Na arte sensacional de Carrick, Lavinia Whateley e Yog-Sothoth no ritual de Sentinel Hill.

Naquele ano, Lavínia engravidou e nove meses depois deu a luz a um menino chamado Wilbur. Os moradores de Dunwich recordam dessa noite, pois houve uma tempestade elétrica como nenhuma antes na história do vilarejo. Noah foi até a vila e discursou sobre o nascimento de seu neto dizendo coisas sem muito sentido que os presentes preferiram ignorar. Ninguém perguntou quem era o pai, todos achavam que Lavínia não era muito certa e que não seria bom fazer perguntas que pudessem deixar o velho incomodado.

O bebê era saudável mas tão estranho que ninguém tinha permissão de vê-lo a não ser a mãe e o avô. Meses mais tarde a criança foi apresentada à comunidade que chocada percebeu que o menino parecia mais velho do que diziam. Wilbur tinha a estatura de uma criança de 4 anos, quando não deveria ser mais do que um bebê de colo. Ele também era albino, suas feições desagradáveis causavam estranheza e sua voz era soturna. Noah orgulhoso contava que ele havia aprendido a falar com apenas 11 meses e andava com apenas 1 ano e meio. Um comentário desabonador a respeito da aparência de Wilbur fez com que uma mulher ficasse cega, depois disso ninguém mais abriu a boca para falar da criança.

Em Sentinel Hill, Wilbur começou a ser educado para assumir o lugar do avô. Com 3 anos, ele aparentava ter pelo menos 8 e já lia os pesados tomos esotéricos. No topo da montana ele era capaz de dizer os nomes secretos de Azathoth e declamar a poesia perdida de Khemi. Certa vez teria tomado um livro nasmãos e gritado o nome de Yog-Sothoth fazendo a terra tremer e os animais uivarem a milhas de distância. Alguns vizinhos afirmavam ter visto Wilbur e Lavinia uma noite, quando Sentinel Hill emitiu uma luminosidade fantasmagórica. Os dois vagavam pela floresta e o pequeno Wilbur parecia usar "um estranho cinturão e calças escuras".

Com o passar do tempo ele passou a andar pela floresta em suas divagações solitárias. Por vezes ia até Dunwich onde as pessoas viravam o rosto e evitavam lhe dirigir a palavra. Carregava consigo um revólver sempre carregado para se defender dos cães que ladravam furiosos quando ele passava. Dizem que morria de medo de cães e havia atirado em mais de um diante dos donos incrédulos.

Certo dia, Wilbur visitou Dunwich, ele não tinha mais do que 11 anos e era alto como um adulto, suas feições haviam ficado ainda mais grosseiras. Ele adentrou a única casa de comércio e avisou que Noah havia morrido na noite anterior. As pessoas lhe deram as condolências escondendo o alívio, o velho afinal era mortal. O menino sorriu maliciosamente, virou as costas e voltou para casa.

Embora sua reputação diante das pessoas do vilarejo não fosse das melhores, Wilbur ganhou o reconhecimento por ser um profundo conhecedor das artes ocultas. Ele começou a se corresponder com vários estudiosos do assunto, entre os quais o Dr. Henry Armitage da Universidade Miskatonic. Enviava cartas para pessoas em todo mundo e recebia de volta envelopes com carimbos postais de lugares distantes.

Ninguém acreditava que Wilbur tivesse apenas 17 anos e todo aquele nível de conhecimento em história e ocultismo. Ele media quase 2 metros de altura e chamava atenção pela aparência. Na noite de Halloween de 1924, Lavinia desapareceu sem deixar vestígios, ela foi vista pela última vez andando pela floresta falando coisas incoerentes sobre o filho. Dizem que estava senil e que deve ter sofrido algum acidente na escuridão da mata.

Pouco depois, Wilbur se mudou do casebre e foi com seus livros ocupar uma cabana ali perto. Começou a enviar pedidos insistentes a Armitage requisitando acesso a um raro volume trancafiado na Biblioteca Orne. Quando Armitage tomou conhecimento do conteúdo bizarro do livro, a edição em latin do Necronomicom escrito por Ollaus Wormius, proibiu imediatamente a consulta ao volume. Wilbur tentou obter o livro em outras fontes, mas graças aos apelos de Armitage todos lhe negaram acesso. Ávido por continuar suas pesquisas, Wilbur invadiu a biblioteca para roubar o tomo.

Não sabia que o grande cão de guarda da Biblioteca estava solto e foi atacado pelo animal. Seu corpo foi encontrado dilacerado no dia seguinte, o cão ainda uivava sobre seus restos no chão da biblioteca.

A descoberta do corpo de Wilbur não foi o fim da estoria, pois o verdadeiro Horror de Dunwich ainda haveria de ser descoberto, mas isso é assunto para outro artigo.

A aparência de Wilbur era descrita da seguinte forma: "Seu aspecto facial era notável para sua maturidade, pois embora partilhasse a ausência de queixo da mãe e do avô, seu nariz firme e precocemente formado combinava com a expressão dos olhos grandes, escuros, quase latinos para lhe dar um ar de inteligência quase adulta e quase preternatural. Entretando, ele era extremamente feio, apesar do ar inteligente, com algo de caprino ou animalesco nos lábios grossos, pele amarelada de poros grandes, cabelos crespos ásperos e orelhas extremamente alongadas".

O aspecto condiz com a imagem no topo desse artigo.

Quando ele foi achado morto na biblioteca as testemunhas comentaram a respeito de um fedor nauseante que permeava o local. Embora violentamente arruinado, ainda era possível perceber certas peculiaridades no grotesco cadáver. Abaixo de seu quadril, sua pele era coberta com uma camada grossa de cabelos negros. De seu abdomen cresciam tentáculos, cinza esverdeados terminando em bocas vermelhas. Olhos sem iris surgiam na altura da virilha e um tipo de cauda mal formada de cor púrpura descia pelas costas saindo da coluna. Suas pernas, a despeito do pelo, pareciam as patas de um sáurio pré-histórico, cada uma terminando em uma pata rígida semelhante a cascos. Seu sangue era uma substância viscosa verde-amarelada. Após a morte seu corpo se desintegrou rapidamente desaparecendo em uma massa branquicenta que se desmanchou. Já essa descrição confere com a excelente imagem ao lado.

Wilbur é o exemplo clássico de um "Favorecido pelos Antigos". A mutação em seu corpo que havia começado cedo e continuava a transformá-lo em algo cada vez menos humano não se completou. Só é possível conjecturar no que ele teria se transformado se tivesse tempo para sofrer a mudança completa.

2 comentários:

  1. Poxa que historia maneira, vou ler esse livro o mais rápido possivel. Estou bolando uma cronica de mago o despertar com temas dos mythos, e essa historia me deus otimas ideias.

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  2. cacete, to gostando muito desses contos

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