sexta-feira, 16 de outubro de 2020

O Enigma de Banjawarn - Uma Explosão atômica foi deflagrada por uma Seita Apocalíptica?


Algumas pessoas acreditam que numa escura noite de 1993, todos os nossos medos se tornaram verdade em um remoto ponto, no vasto deserto australiano. Primeiro houve um grande flash de luz, e uma imensa explosão que subiu rumo ao céu, e uma nuvem tóxica na forma de um cogumelo se formou. Sismógrafos registraram o acontecimento, e membros de uma seita Apocalíptica gritaram orgulhosos pelo que haviam realizado.

Os técnicos que registraram o fato e as testemunhas que viram os acontecimentos contaram uma perturbadora história: um grupo de extremistas religiosos havia conseguido detonar uma arma nuclear, deixando agências internacionais de inteligência em estado de alerta desde então. Este foi o Incidente conhecido como Banjawarn Bang, um acontecimento que até hoje divide opiniões entre céticos e crentes. Mas até onde a história é verdadeira e onde tem início a Lenda Urbana?

Tudo aconteceu em um lugar isolado da civilização, 700 quilômetros ao norte da cidade de Perth em um trecho árido do deserto australiano; uma região com meio milhão de acres, ocupada apenas por algumas fazendas de ovelhas. O local era chamado de Banjawarn, uma terra de calor abrasador e de poeira vermelha, onde as poucas minas de extração de minérios e estações de animais reúnem os habitantes que chamam essa aridez de casa. É sem dúvida o local perfeito para conduzir uma experiência que você não quer que ninguém fique sabendo.


É verdade que um terremoto de magnitude 3.6 na Escala Richter atingiu a porção oeste da Austrália naquela noite. Às 11:03 da noite, no dia 28 de maio de 1993. Foi um fenômeno bastante estranho, sobretudo em face do que aconteceu após o tremor: uma enorme explosão e um estranho flash de luz cegante. O acontecimento foi relatado por muitos habitantes de Banjawarn como motoristas de caminhão, prospectores e povos aborígenes. As pessoas especulavam a respeito da natureza daquele fenômeno. Teria sido uma explosão subterrânea em uma mina? O choque de um meteoro na calada da noite? Ninguém sabia ao certo.

Os relatos de testemunhas incluíam efeitos de luz que não podiam ser relacionados a nenhum fenômeno conhecido. Alguns afirmaram ter visto uma luz avermelhada cobrindo o céu noturno, outros uma luminosidade amarelada seguida de um flash de luz branca. Aos poucos, o céu assumiu uma coloração estranha que os nativos e colonos nunca haviam visto antes, coloração que foi diminuindo a medida que chegou a madrugada e sumiu de um todo ao amanhecer. O mistério era intrigante mas ninguém soube dar uma explicação razoável. Sem informações a respeito da ocorrência, o assunto foi aos poucos sendo esquecido.

Mas em meados do ano 2000, a ideia de que o incidente Banjawarn pudesse ter sido causado pela detonação de um artefato nuclear começou a ganhar força. O primeiro a levantar essa possibilidade foi Bill Bryson que publicou um livro chamado "In a Sunburned Country" (Em uma terra queimada pelo sol). Embora Bryson tenha devotado apenas um pequeno capítulo de seu livro à estória, ela foi o suficiente para atrair a atenção de muitas pessoas.


Bryson relatava que a explosão havia ocorrido na Estação Banjawarn, uma região muito isolada, preterida até pelos pastores de ovelhas mais destemidos e com poucas minas de metais ainda ativas. O local havia sido comprado por um misterioso grupo de japoneses e serviria como um destino de peregrinação para um obscuro secto religioso. Eles construiriam ali um retiro isolado do restante do mundo, onde poderiam meditar sem a intromissão ou os olhos de curiosos. O nome do culto era Aum Shinrikyo.

Na época em que adquiriram aquela faixa inóspita de terras, os habitantes locais acharam estranho, mas não julgaram que poderia haver algo perigoso, afinal se tratava apenas de um grupo de estrangeiros em busca de sua pequena porção do paraíso. A Austrália havia recebido ao longo de sua história uma confluência de missões e grupos religiosos que se estabeleceram ao longo de todo território. Mas ocorre que o Aum Shinrikyo (que significa "O Ensino da Suprema Verdade") não era apenas mais uma seita religiosa. O grupo extremista havia sido responsável pelos ataques terroristas ao Metrô de Tóquio em 1994 e 1995. Seus membros fanáticos utilizaram Gás Sarin e XV para envenenar os dutos de ventilação e causar 13 mortes, ferir gravemente 54 e afetar mais de 980 inocentes.

Liderados por Shoko Asahara, um líder carismático que se apresentava como a encarnação de Cristo, a Aum Shinrikyo era uma Seita Apocalíptica que se valia de vários elementos de sincretismo religioso. As bases para seu sistema de crenças retirava ensinamentos do budismo tibetano e indiano, do hinduísmo, de preceitos mileritas, de trechos do Apocalipse Cristão e até dos escritos de Nostradamus. Asahara delineou uma Profecia que previa o Fim dos Tempos, através de uma Guerra Nuclear que iria deflagrar o Apocalipse, conforme previsto na Bíblia. Em sua Profecia, a humanidade seria varrida do planeta, exceto pela pequena elite formada pelo Culto do Aum. O Culto então teria a missão sagrada de espalhar a palavra de "salvação" e garantir o ressurgimento da Civilização em uma nova ordem mundial. Asahara previu que o Apocalipse aconteceria em 1997 e se iniciaria com ataques nucleares dos Estados Unidos a diferentes países, entre eles, o Japão. 


A Conspiração, ainda segundo Asahara, envolvia vários grupos poderosos com influência internacional: a maçonaria, seitas secretas, a família real britânica e vários grupos poderosos no Japão. O líder supremo da Aum acreditava que uma das maneiras de evitar o pior era deflagrar um ataque nuclear preventivo contra os Estados Unidos, pegando o "Grande Satã" (designação dele ao país) de surpresa. Uma explosão nuclear na América anteciparia o Apocalipse, e este viria ainda durante a encarnação de Asahara.

Segundo artigos publicados por jornalistas do New York Times em 1997, um Comitê do Senado Federal Norte-Americano investigou a tentativa do Aum Shinrinkyo de adquirir armamento nuclear que seria comprado da Rússia. As negociações estavam bastante avançadas, mas foram frustradas graças a ação de grupos anti-terrorismo e uma operação conjunta das agências americana e russa. Eles também encontraram indícios de que a Seita havia adquirido substâncias químicas, usadas em Guerra Biológica de nações que tinham um estoque desse material, como Iraque e Egito. O Comitê concluiu que testes com as Armas Químicas usadas no atentado ao metrô de Tóquio haviam acontecido na propriedade do grupo no Sertão Australiano. Na ocasião, o grupo teria usado uma pequena fração de Sarin disseminado no ar em um rebanho de ovelhas em 1992, uma ano antes do ataque.   

O artigo publicado no New York Times felizmente não causou pânico. A razão para isso é que ele só se tornou manchete após os ataques ao metrô, quando o Aum Shinrikyo já estava sob ataque de agências anti-terrorismo mundo afora. Os líderes da Seita, incluindo Asahara, haviam sido presos 19 meses antes, seus recursos financeiros foram bloqueados por ordens expressas e membros interrogados a respeito de seu envolvimento em ataques terroristas. Templos da Aum foram invadidos em várias nações: na Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos e é claro, no Japão.


Muitos interrogatórios resultaram na confirmação de que a Seita planejava adquirir armas nucleares e usá-las em um ataque aos Estados Unidos. O fato da área em Banjawarn ser citado repetidas vezes por membros da Seita fez com que investigadores presumissem o pior. Que a Aum já poderia ter adquirido uma bomba suja - um dispositivo nuclear menor, mas ainda assim capaz de produzir grande estrago em uma área metropolitana. Um destes dispositivos poderia ter sido responsável pelo fenômeno inexplicável de Banjawarn.

Entra em cena, Harry Mason, empregado de uma mineradora sediada na Austrália Ocidental. Ele era também um ufólogo, teórico de conspirações e entusiasta da noção de que "super-armas" teriam sido inventadas pelo genial Nikola Tesla. No início de 1995, um jornal local, o Kalgoorlie Miner relatou que o terremoto de 1993 havia sido causado por uma bola de fogo. Mason e um amigo decidiram tentar descobrir o que havia de fato acontecido e quem sabe determinar a localização de uma cratera deixada pelo impacto de um meteoro. Eles imaginavam que a descoberta poderia trazer fama e fortuna. Eles entrevistaram habitantes locais que testemunharam o acontecimentos que havia ocorrido há mais de um ano. Também alugaram um pequeno avião para sobrevoar a área e tentar reconhecer o local do impacto. 

Durante sua investigação, Mason se convenceu de que a destruição não havia sido causada pelo choque ordinário de um meteoro. Ele começou a colher informações de outras quedas de meteoros ocorrida na Austrália Ocidental e concluiu que não ela não tinha nada de similar. Mason estava convencido de que o Deserto havia sido o palco do teste de alguma arma muito avançada, que ele desconfiava poderia ser o protótipo da "Arma E/M" (Arma Eletromagnética), inspirada pelo trabalho de Tesla.


Em março de 1995, Mason estava investigando o ocorrido quando chegou a sua atenção a notícia do ataque do Aum Shinrikyio ao Metrô de Tóquio. As notícias eram especialmente chocantes para os habitantes do Oeste da Austrália, porque o nome da Seita responsável pelo ato de terrorismo era o mesmo daquela que havia comprado as terras na Estação Banjawarn. Por ser distante de tudo, ninguém sabia de fato o que acontecia na Estação ou no que aqueles forasteiros estavam envolvidos. Mason rapidamente pesquisou tudo que podia a respeito do Culto do Apocalipse e desenvolveu uma assustadora teoria: o Aum Shinrikyo teria utilizado Banjawarn como local de testes para armas táticas, para testes com armas biológicas e possivelmente para armamento experimental de última geração. Mason alertou as autoridades, inclusive o Comitê do Senado americano, a respeito da Explosão ocorrida em 1993. Na sua opinião, ali estavam sendo testadas armas que poderiam causar destruição sem precedente, quanto mais nas mãos de indivíduos fanáticos dispostos a empregá-las.

A essa altura, o Comitê estava alguns passos à frente de Mason. Os ataques em menor escala do Aum Shinrikyo no Japão já haviam acionado o radar de autoridades anti-terrorismo mundo afora. Mesmo assim, o aviso de Mason atraiu a atenção do comitê. Eles sabiam que um representante do Aum (que controlava mais de um bilhão de dólares em dinheiro) havia viajado pela Rússia por algum tempo, tentando comprar armas nucleares, mas aquela havia sido a primeira vez que eles ouviram falar do evento Banjawarn, possivelmente de origem nuclear. Os investigadores do comitê pesquisaram os informes de Mason com o Centro de Sismologia para verificar se havia algo consistente com um teste nuclear na história.

As ondas de choque de um ataque nuclear produzem tremores sísmicos que podem ser identificados e diferenciados de terremotos. Desta forma testes nucleares da Coréia do Norte foram confirmados em 2006, 2009, 2013 e 2016. Os tremores em Banjawarn eram, no entanto, diferentes de abalos provocados na Coréia. Pareciam com simples terremotos, nada mais do que abalos naturais.

Além disso, segundo o comitê, haviam outros problemas na teoria de Mason a respeito de armas nucleares. Quando a alegada explosão ocorreu, Aum Shinrikyo ainda não estavam ocupando a propriedade na Estação. Eles teriam ocupado a área apenas três dias depois do incidente. Além disso, os membros da Seita não teriam se mudado para a propriedade com equipamento até Setembro, o que não se encaixa na cronologia sugerida por Mason. Além disso, se os membros do Aum já tinham se tornado uma potência nuclear, porque eles teriam arriscado um ataque com armas biológicas no Japão?


A teoria de Mason tinha outros problemas, sendo que sua crença em uma super-arma eletromagnética produzindo bizarros efeitos óticos era muito contestada. As luzes eram reportadas de maneiras diferentes e algumas pessoas reconheceram posteriormente que o flash de luz foi bem menor do que o dito anteriormente. De fato, não havia evidencias sequer de que as luzes realmente aconteceram.

A história ficou dessa forma por um bom tempo. O tremor teria sido causado por um meteoro que gerou um terremoto, ainda que não existisse uma cratera de impacto. Foi então que em 2013, algo aconteceu na Rússia que poderia finalmente corroborar que o acontecimento havia sido causado por um meteoro.  Em 15 de fevereiro, um bólido entrou na atmosfera da Terra  com velocidade de Mach 55. Ele explodiu a 30 quilômetros sobre Chelyabinsk com uma potência 30 vezes maior do que a força explosiva da Bomba de Hiroshima, partindo vidros em toda cidade. A explosão ativou sismógrafos em magnitude 4,2 na Escala Richter. Não havia cratera de impacto, uma vez que o meteoro explodiu em pequenos pedaços caindo em uma vasta área. Tudo indicava que o Incidente em Banjawarn havia sido bem similar ao da Rússia. Uma vez que ele ocorreu em uma área isolada, com pouca população não é de se estranhar que ele não tenha sido documentado e que as pessoas só o sentiram ao longe.

Mas ainda restavam algumas suspeitas. O abalo na Austrália parece estar localizado a uma profundidade de 10 quilômetros, enquanto o da Rússia é listado com 0 quilômetros de epicentro. O que indica que o choque em Banjawarn teria sido seguido de um terremoto. Uma vez que as listagens do Centro de Sismologia estão incompletas, alguns supõem que possa ter havido alguma alteração nos dados, evidenciando algum tipo de conspiração para acobertar os fatos.


Alguns teóricos continuam assumindo que possa ter acontecido uma explosão nuclear na região da Estação Banjawarn. Traços de radiação residual foram captados na área, em pequena concentração, é verdade, mas suficiente para apontar para uma explosão de natureza nuclear. Técnicos refutam afirmando que esse trecho do deserto é rico em minerais radioativos e que as leituras podem ser decorrentes deles. E também existem aqueles que defendem a possibilidade de que uma arma secreta tenha sido empregada pela Seita e que esta teria sido recolhida por agências internacionais após uma ação de órgãos internacionais. 

A verdade, ninguém sabe ao certo...

Hoje, Shoko Asahara, o fundador da Aum Shinrikyo, aguarda no corredor da morte do sistema penitenciário do Japão. Doze de seus colegas o acompanham como co-conspiradores dos ataques biológicos ao metrô. Ovelhas ainda pastoreiam pelo cenário desértico da Estação Banjawarn. Em algum lugar, espalhado nessa área, podem estar os fragmentos de meteoro ou quem sabe os restos de uma bomba suja que deveria antecipar um Armagedom marcado por fogo nuclear. Harry Mason faleceu em 2001, mas suas conjecturas e imaginação construíram uma lenda duradoura nessa terra vermelha queimada pelo sol.

4 comentários:

  1. O jogo Earthbound (ou Mother 2) um dos meus preferidos fez uma referência desse grupo com um visual misturado com o KKK, mas que utilizava vestimentas azuis, como desse grupo. Eu tinha acabado de jogar e procurar informações quando vi esse post falando sobre. Arrepiei!

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  2. Muito bom o texto e a história, esse blog sempre me deixa de cabelo em pé.

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  3. Seitas fanáticas com armas de destruição em massa é algo aterrador . A possibilidade de uma delas ter adquirido uma super-arma idem .
    Pelo menos a partir dessa história , é possível configurar uma campanha . Talvez com um culto adquirindo a super-arma através das cinzas de Nikola Tesla .

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